Osmar Macedo, a alegria eternizada
Claudefranklin Monteiro Santos
01/07/2017
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De Carnaval em Carnaval, a cidade de Salvador se reinventa sob as hostes de suas tradições. O povo, em brasa, ainda segue atrás do trio elétrico. Uma multidão, de gerações diferentes, é tomada de entusiasmo pela magia da guitarra baiana. Velhos e novos ritmos, e a mesma emoção. Mas, do alto da estátua, inerte, jaz um lamento de saudade e de nostalgia. Cadê Osmar? Pergunta o poeta na praça, há 20 anos.
Gênio, visionário, artista, engenhoso. Quantos Osmar Macedo seriam necessários para comportar essas e inúmeras outras assertivas? Sem sombra de dúvidas, o tamanho da sua alegria estampada no rosto, em cima do trio elétrico, de braços abertos, de onde o soteropolitano e o Brasil se acostumaram a vê-lo, em seu velho bradar invocativo para a folia.
A notícia de seu falecimento tomou espaço nos principais meios de comunicação do país. A Folha de São Paulo, em sua edição do dia 1º de julho de 1997, estampou a manchete: Morre um dos criadores do trio elétrico, referindo-se ao dia anterior. A matéria, assinada por Christianne Gonzáles, dava uma dimensão daquela significativa perda para a cultura brasileira.
Natural de Salvador, em 22 de março de 1923, Osmar Álvares de Macedo foi criado pela mãe e por três tias maternas. Era um ambiente musical e dele nutriu-se da inspiração que lhe acompanhou por toda a vida. Caçula, ficava às voltas com um irmão, mais velho sete anos, também músico, com quem desenvolveu a arte de ouvir. Bandolins, violões, violino e piano faziam parte de seu universo infantil.
Assim, as primeiras mulheres de sua vida, ao lado de seu irmão, foram as iniciadoras musicais de Osmar, que aprendeu a tocar em tenra idade, crescendo e conhecendo nos anos 30, os ritmos que vinham de Pernambuco, a exemplo do Frevo, e tendo a oportunidade de conviver com Garoto e outros nomes da música brasileira, com quem aprendeu muito e mais tarde, imprimiu seu próprio estilo. Do pai, descendente de ingleses, herdou a habilidade mecânica, a proatividade para buscar soluções diante de situações-problemas.
E nesses cenários díspares, cresceu nele a inventividade e a engenhosidade de que lhe foram muito peculiares, alcançando as décadas de 40 e 50, quando em parceria com o amigo Dodô, inventou os embriões do carnaval elétrico da Bahia: o pau elétrico, hoje a guitarra baiana; e a Fobica, depois trio elétrico.
Sua vida foi esse pêndulo entre a música e a mecânica. Entre os anos 40 e 90, construiu uma sólida carreira no campo da metalurgia, ora como professor, instrutor, gerente, ora como idealizador de uma infinidade de projetos, inclusive na área da construção civil, naval, ferroviária e até mesmo na aeronáutica, como pontes, elevadores, equipamentos diversos, quando lhe valeu mais a saga criativa do que o lucro.
Casado duas vezes e pai de sete filhos, Osmar Macedo viveu por 74 anos. Do primeiro casamento, nasceram aqueles que levariam seu legado adiante: Alberto, Armandinho, Aroldo e André. Os filhos da alegria alçaram a sonoridade de Osmar Macedo a patamares até hoje referências para inúmeros músicos. E isso, em si, explica a longevidade do grupo, em meio a tantos modismos passageiros.
Osmar Macedo, com uma pedagogia singular, educou seus primeiros filhos, órfãos de mãe muito cedo, a viverem a música em sua essência, a sentirem-na para além das partituras e acordes. No afã da liberdade assistida e participativa, fomentou sua genialidade neles e a legou ao mundo em forma de alegria, sua patente registrada na eternidade.
* Claudefranklin Monteiro Santos é professor do Departamento de História da Universidade Federal de Sergipe