Entrevista: Robertinho Lago
Robertinho Lago começou a tocar de forma autodidata, no fundo de casa, onde ocorriam os ensaios, entre 13 e 14 anos tocou pela primeira vez em cima do trio Carbasa (famoso trio de Cruz das Almas).
Naquela época ainda não era comum cantores em trios elétricos, assim, a guitarra era o destaque. Sua musicalidade foi influenciada por grandes mestres da musica popular como: Luiz Gonzaga, Gilberto Gil, Moraes Moreira, Pepeu Gomes e seu ídolo maior Armandinho Macedo. Este último, além de ídolo é um grande amigo, que em 2012, em Cruz das Almas numa praça pública, presenteou Robertinho com uma nova guitarra baiana no momento em que Lago fazia uma participação especial no show da banda Armandinho, Dodô e Osmar.
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A SEGUIR CONFIRAM UMA ENTREVISTA EXCLUSIVA PARA O PORTAL
(Igor Martins - Guitabaiana.com) Como você iniciou na música e como chegou na Guitarra Baiana? Nos conte um pouco dessa sua história.
Em primeiro lugar quero agradecer pela oportunidade que vocês estão me dando, eu fico muito honrado em participar desse projeto. Bem, eu despertei para música muito novinho, minha prima ligava uma vitrola aos domingos e todos ficavam em volta ouvindo, os maiores dançavam e tal e eu ficava fascinado com o vinil rodando, e isso rolou por uns anos.
Depois mudamos para outra rua onde tinha uma banda que ensaiava quase todos os dias e, claro, eu lá colado. Também em casa meu primo começou a tocar violão e eu sempre ficava de olho na posição que ele colocava os dedos, daí quando ele saia para trabalhar eu tentava repetir e fui indo, até que, sem método e sem professor, aprendi a tocar o violão e passei a ensinar para ele (claro que o básico do básico né?!).
Nesse meio tempo começou a ensaiar no fundo da minha casa o trio elétrico da cidade (trio Carbasa). O galpão era colado com meu quintal e eu colocava um monte de bagulho e subia para ver .Fiquei extasiado quando ouvi o som da Gb pela primeira vez. Criança não podia entrar no galpão e eu ficava louco pra ver mais de perto ou até tocar a mão na Gb, até que um dia consegui entrar enquanto os músicos deram uma pausa e passei a mão na Gb (rsrs) tomei um choque, uma bronca e uma carreira simultaneamente, mas valeu a pena.
Meses depois vendi uma bicicleta que havia ganhado de presente de aniversário e comprei um cavaquinho (isto foi às 17hs de uma sexta-feira; Corri em busca de alguém para afinar, pois não sabia nada do instrumento; Com muita dificuldade, um senhor afinou, daí fui pra casa e às 18hs30m. Fui para um quartinho no quintal e saí de lá só as dez da noite, mas já tocando 5 musicas! Claro que nada perfeito né, mas dias depois descobri que a afinação estava errada (risos), tive que começar tudo de novo, e fui em frente, mesmo sem professor e sem nada para me ajudar, só ouvindo os ensaios do trio, quatro meses depois toquei meu primeiro carnaval em cima de um trio, isso aos 14 anos daí não parei mais e a Gb passou a ser meu instrumento preferido.
(Igor Martins - Guitabaiana.com) Como se deu a sua entrada no Trio Tapajós e como era a convivência com seu Orlando Campos?
Fui convidado para entrar no Tapajós em 1990, na época eu fiz um show com a banda Energia no Periperi e estavam lá Ed Barbicha, então baixista do Tapa, e Orlandinho {Orlando filho}, daí Barbicha já tinha falado de mim e então rolou um contato e a proposta. Eu aceitei na hora, claro, pois era um sonho antigo tocar no Tapajós e creio que de muitos músicos baianos e o dado interessante é não rolou nenhum ensaio (risos). O trio praticamente tocava toda semana e lembro que Orlandinho me ligou e disse: arrume sua mala, vamos viajar para tocar em uma cidade de Sergipe e depois fazer a política em alagoas. Só voltamos três meses depois e assim lá fui eu, muito feliz e realizado, claro!
Sobre seu Orlando {Orlandão, como chamamos}, o fato marcante foi que ele estava se recuperando de um derrame e, nos primeiros shows, ele não estava, daí em um belo dia, Orlandinho me disse: prepare uns instrumentais pois meu pai chega hoje a noite e ele testa os guitarristas assim. Cara, a base tremeu (risos), não tinha Gb no trio, a banda já plugada pra iniciar o show, e ai? Chamei a galera só no retorno e ali passamos três frevos na guitarrão mesmo: vassourinhas, charriot e brasileirinho, daí quando seu Orlando subiu ao palco, as primeiras palavras dele foram: quero apresentar o novo guitarrista do Tapajós e ele vai nos brindar com um show instrumental ! Mas graças a Deus deu tudo certo e conquistamos o Mestre (risos), e assim passei oito anos no Tapajós (os quais considero os melhores de musica em minha vida).
Gravei dois discos, conquistei a amizade e o respeito de todos e tive a honra de passar bons momentos com um dos pais do trio elétrico, seu Orlando Campos, com quem aprendi muito através dos seus ensinamentos e suas histórias, também devo muito a Orlando filho (Orlandinho).
(Igor Martins - Guitabaiana.com) Você sentiu o “baque” com a chegada do axé e seus teclados? Ou entendeu com tranquilidade o que estava ocorrendo no fim dos anos 80 e início dos 90?
Claro, senti muito sim! Foi um momento difícil em que todos da Gb tivemos que nos adaptar a uma nova e triste realidade. Cheguei a parar de tocar por um bom tempo e achava que tinha chegado ao fim a história da Gb, mas graças à família Macedo e tantos outros nomes e guerreiros não perdemos a batalha.
(Igor Martins - Guitabaiana.com) No meio dos que entendem de música, você é tido como um grandioso representante da música de trio. Você sente esse reconhecimento?
Fico honrado só em vocês lembrarem de mim, mas nunca me achei mais do que eu sou. Me considero um operário da musica, o menor diante dos pequeninos e sempre sabendo quanta gente boa tem no mundo da Gb e que preciso aprender com todos sempre e todos os dias!
(Igor Martins - Guitabaiana.com) Quanto ao seu set, o que você usa hoje e como era no tempo do Tapajós? Já precisou improvisar muito por causa de equipamentos “difíceis”?
Bem, eu nunca fui muito de parafernália não... Uso hoje uma gt10, mas antes dela usava uma 3030 zoom e achava o máximo (risos). Não tenho paciência pra mexer em pedais, assim que chega o som ta bom pra mim. Na época do Tapajós eu usava um overdrive, um chorus e um equalizer boss. La já tinha esse set, depois trocamos por um zoom 9030 e fui até o ultimo show com ele e gravação dos discos e tudo mais. E sim, claro que já tive que inventar algumas artes por problemas em pedaleira. Uma vez toquei com um pre de gravador (risos), mas é isso, todo mundo passa aperto.
(Jonathan Raphael)Você tem planos de lançar músicas autorais instrumentais para guitarra baiana?
Sim, tenho, e tenho composições minhas pra Gb, mas sou chato demais com as coisas que crio, gravo, não gosto e deleto tudo (risos) mas em breve devo lançar alguma coisa!
(Fábio Batanj) Robertinho Lago, como vê a guitarra baiana hoje em termos de ergonomia, maciez e tocabilidade, se comparada com as antigas ? O que mudou e lhe agrada mais e o que não precisaria ter mudado?
Vixe Batanj, se tu soubesse as primeiras Gbs que toquei, mano (risos)... Já chegeui a cortar os dedos, imagine? Graças a Deus, hoje temos muita gente genial criando Gbs fantásticas e você é um deles, claro.
Mas eu não sou muito exigente não, afinou, não cortou meu dedo e não tem som ‘agudão’, ta bom (risos) .
(Marcus Devolder- Guitabaiana.com) Queria acrescentar algo a pergunta do Batanj; Queria saber como Robertinho vê a evolução do instrumento e poder dizer quais ele teve acesso (Dodô, Jog, Del Vecchio... e por aí vai... desde as Iniciais, as Pré-Elifas e as Pós-Elifas...)?
Vejo com muita alegria, Marcus Devolder! Nós que carregamos a bandeira da Gb, bem sabemos da sua importância pra nós que a usamos e para a história do carnaval da Bahia.
Eu tive várias. A primeira foi uma feita por um senhor de Feira de Santana, seu Maninho, porém quando chegou em minha mão já estava um lixo mesmo (risos), era horrível, acabava com meus dedos, mas fazer o que, só tinha ela...
Antes de ir pro Tapajós, consegui uma Del Vecchio. Lá no Tapa tinha uma feito por seu Vitório, mas na época infelizmente usei pouco a Gb, pois a proposta da banda (na minha época) era o axé music.
Em 2008 iniciei minha era Elifas, ai sim a coisa foi mudando de figura ! A primeira foi uma caicó, depois outra modelo novo, daí a Studio e então cheguei na Star Series (modelo Armandinnho) que conservo até hoje.
Robertinho Lago e Banda Trielétrica - 2013 - ´Vídeo do Canal: Ivan Americano
Música: El Cumbanchero
(Fellipe Santana) Na sua visão, um jovem músico iniciante na baianinha deve estudar e tentar ao máximo defender as tradições, ou inserí-la à sua própria linguagem e pretensão musical?
Creio que as duas coisas, Felipe Santana! A busca da evolução sim, mas sem nunca deixar de lado o legado histórico da guitarra baiana. Eu defendo com unhas e dentes a guitarra baiana e sigo à risca a escola Armandinho, Dodô e Osmar e posso dizer com muita propriedade que, na verdade, somos todos filhos de Dodô e Osmar, e vou continuar até meus últimos acordes tocando dentro dessa tradição.
(Elifas Santana) Gostaria de saber do Robertinho como ele define a importância da Guitarra Baiana no cenário musical atual e qual importância desse instrumento em sua época de Trio?
Grande Elifas ou, como eu te batizei, ElisFERA! Graças a todos nós envolvidos nessa luta, levantando a bandeira da Guitarra baiana e, claro, sem vocês luthiers não seria possível, eu vejo a Gb hoje como um instrumento que rompeu fronteiras e conquistou um espaço a nível quase que mundial e, na mão de muitos músicos consagrados no mundo, é um instrumento que pode ser inserido em qualquer cultura ou estilo musical . A guitarra baiana faz parte de mim, é parte de minha alma e sempre foi assim, desde o primeiro contato, até nos dias de hoje e será até meu ultimo acorde !
(Marcos Stress- Guitabaiana.com) Gostaria de saber do Robertinho, na visão dele, como os novos guitarristas podem contribuir para a guitarra baiana?
Creio que já vem contribuindo muito e você é um deles, Marcos Stres! Tenho visto muitos jovens tocando e me emociono, pois vejo que cada vez mais jovens guitarristas que se encantam com o fascínio que a guitarra baiana proporciona e que eles podem ser a virose musical e contagiar mas adeptos da nossa guitarrinha fantástica.
(Yuri Barreto) Gostaria de saber o que você imagina para a Guitarra Baiana no futuro?
Yuri Barreto você é uma das peças fundamentais no presente e para o futuro da guitarra baiana! Eu imagino e profetizo um reconhecimento mundial da guitarra baiana e acho que todos nós defensores dessa bandeira devemos dar o Máximo, cada um dentro do seu estilo e segmento musical, buscando evoluir, mas ao mesmo tempo respeitando a história e assim haveremos de ter a guitarra baiana no seu lugar de direito!
(Igor Martins - Guitabaiana.com) Caso ainda não conheça o site www.guitabaiana.com, temos uma seção de artistas e outra dos mitos...logicamente é uma escolha subjetiva, mas temos o prazer de adiciona-lo na seção dos que fizeram história. Sua trajetória e vida dedicada ao instrumento precisa ser contada e demonstrada para as futuras gerações. Deixo o espaço aberto para dizer o que vier a sua cabeça...e Robertinho, obrigado por existir!
Pô, eu que tenho que agradecer Igor pela lembrança, pelo carinho e pelas perguntas dos colegas e dizer que me sinto mas uma vez honrando em fazer parte desse grupo onde tem tanta gente boa e grandiosos músicos de igual importância para a história da guitarra baiana. E você, amigo Igor Martins, meus parabéns pela iniciativa e minha profunda gratidão.
Que Deus te ilumine, muito obrigado.